Vamos problematizar? | Retratação de personagens femininas: os clichês e estereótipos que ninguém aguenta mais

Este texto foi originalmente publicado em 26 de julho de 2016.

Vamos começar com a óbvia objetificação e sexualização do corpo da mulher, que está diretamente ligada ao fanservice exagerado que encontramos principalmente em animes que levam a classificação de ecchi. Alguns títulos famosos são: No Game No Life, Highschool of the Dead e Zero no Tsukaima.

Primeiro ponto: do que se trata a objetificação e a sexualização do corpo da mulher? Resumidamente, é quando os autores utilizam os corpos femininos como uma ferramenta para atrair leitores/telespectadores e vender mais, fazendo isso por meio da sexualização deles (sabem, aqueles ângulos bizarros em que pegam peitos e bundas, as personagens que têm essas partes do corpo anormalmente grandes, as roupas minúsculas que muitas vezes nem fazem sentido já que o objetivo é muito simples: quanto mais mostrar, melhor, etc).

Já assisti muita porcaria (vários ecchis e haréns), especialmente quando comecei a ver animes há alguns anos, e constatei que elas realmente não eram pra mim. Se eu vejo que a obra está classificada como ecchi ou harém, procuro passar longe; só com um motivo MUITO bom pra me fazer assisti-la mesmo. Mas, pasmem, é agora o negócio fica sério: esse tipo de coisa não acontece somente em ecchis e haréns! O fato é que neles apenas acontece numa quantidade muito maior. Logo, a justificativa do “público alvo” não é válida. Dá pra encontrar isso em praticamente todos os gêneros. E depois de TANTO ver isso, nós, mulheres, já nos cansamos dessa retratação que fazem de nossos corpos. É muito chato saber que te tratam como um objeto e só querem ganhar dinheiro em cima disso.

Eu já gostei muito de Fairy Tail, sou apaixonada por Magi, adoro Btooom!… E nunca acompanhei essas obras por causa do maldito fanservice. Portanto, o que quero dizer é que uma obra não é necessariamente ruim por ter esse problema de objetificação e sexualização (dependendo da quantidade, é claro), mas ela poderia ser ainda melhor se não tivesse. Não é preciso montar no fanservice quando se tem uma história boa a ser explorada.

Agora, deixando a retratação dos corpos femininos de lado, vamos falar sobre as relações entre personagens femininas. Já expliquei anteriormente o que é o Teste de Bechdel e como ele funciona, mas por via das dúvidas, vou colocá-lo aqui novamente:

Primeiramente, se você está em um relacionamento com outra pessoa isso significa que você confia nela. Se você confia nela, ela não vai te trair, mesmo que outra pessoa dê em cima dela. Exigir que essa pessoa simplesmente não CONVERSE com outras é completamente ridículo. Segundo, se seu namorado der trela pra alguém que deu em cima dele, vá se resolver com ele. Terceiro, não é porque uma pessoa é mulher que ela automaticamente vai se interessar pelo seu namorado, talvez ela só queira bater um papo ou criar um laço de amizade. É possível resolver tudo na base da conversa. Seu namorado não é o último homem do mundo. Segue a vida. 

É importante ressaltarmos, no entanto, que a rivalidade feminina é uma construção do patriarcado e que nós não somos inimigas. Essa cena específica de Orange ainda tem outros problemas, pois retrata a Ueda-senpai como o famoso estereótipo de mulher histérica, fazendo com que sintamos raiva dela e não do verdadeiro culpado da história: Kakeru. Afinal, foi ele quem começou a namorar uma menina (porque, de acordo com o patriarcado, é assim que os meninos devem ser – namoradores) gostando de outra, que coincidentemente também gosta dele. Ueda-senpai tem razão de estar brava com o Kakeru, embora colocar a culpa na Naho (a forma com a qual ela reproduziu a rivalidade feminina) seja completamente equivocado e nada justifica o modo com que ela tratou a menina.

Submissão. Complexo de donzela em perigo. Existir em função do protagonista. Mano do céu, não aguentamos mais. 

Já falei um pouco disso no post sobre protagonismo feminino nos animes, mas tem outra coisa que me motivou a escrever esse tópico. Recentemente eu assisti o anime Baby Steps, que no geral é bom (temos que excluir a animação terrível do Studio Pierrot e alguns diálogos de revirar os olhos) e esbarrei com a seguinte cena:

O técnico sugeriu que Ei-chan jogasse uma partida contra a Nat-chan porque ela é um tipo de jogadora diferente do Ei-chan e ele acreditava que isso auxiliaria o Ei-chan na próxima partida dele. Até aí tudo bem. Mas foi então que o Ei-chan perguntou por que ele jogaria contra a Nat-chan, dando ênfase no “… com uma menina?“. Claramente inferiorizando a capacidade da Nat-chan. Eu acredito que tenha sido uma cagada na escrita, porque na realidade o Ei-chan admira muito a Nat-chan e ela é uma ótima jogadora que compete a nível nacional, mas isso não fez com que a cena fosse menos machista. 

É isso. Espero que ao final da leitura todos possam refletir sobre a retratação das personagens femininas nos animes e compreendam por que é necessário que nos posicionemos com relação àquilo que enxergamos como errado. Não vamos consumir materiais que nos ofendam; procuremos, na medida do possível, cobrar uma representação digna naquilo que consumimos; incentivemos o debate em torno dessa questão tão importante que é a representatividade das mulheres.

8 comentários em “Vamos problematizar? | Retratação de personagens femininas: os clichês e estereótipos que ninguém aguenta mais

  1. Eu quis MORRER quando juntou complexo de donzela em perigo+ existir em vunção do protagonista em Sword Art Online. A Asuna era espadachim igual o kirito, participava de uma das melhores guildas, lutava pau a pau com ele na 1ª temporada. PRA QUÊ? Pra casar com ele e er donzela em perigo no 2º arco e depois virar suporte na 2ª temporada. É muito ego masculino viu…

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  2. Mano, amei! Vc é super inteligente e esperta! Literalmente tudo q vc disse eu concordo menos a parte q “se tiver um pouco de objetificação é legal mas se n tiver é mas legal ainda” , n sei se foi com essas palavras, mas eu acho q isso n deveria existir nunca! Quando eu comecei a ver anime (12 anos), eu nem percebia isso kkkkkk pra min era tudo normal. Animes como: Konosuba, No game no life, Rê: zero (um pouco) , isekai em geral, ecchis em geral, e a maioria dos Hentai em geral retratam a mulher como objeto, de forma submissa e muito sexualizada refletindo a cultura japonesa! Com o passar do tempo q eu fui percebendo isso, meu sonho de morar no Japão foi pelo ralo. Hj em dia quero muito morar na Europa, já o Japão quero só visitar msm. E essa parada de mulheres n serem rivais… Mano foi genial. Q bom q vc escreveu esse post, eu amei! As mulheres deveriam realmente ser amigas umas das outras, mas claro, não é pq somos mulheres q n devemos ter caráter, temos q ter s. Não só nós mas como todas as pessoas do mundo! N escrevo posts, nem blogs e nem nada mas super apoio quem escreve e peço para q vc continue com isso para atingir mais e mais pessoas e assim quem sabe termos um universo de animes melhor e bem representado para todo o público. Vou compartilhar, amei, beijos!♥️

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  3. Parabéns pelo seu texto, ficou incrivel e sinceramente a parte que mais me preocupada dessa sexualização é: Na vida real os homens irão se comportar como, tenho medo do poder que essa representação tem para a realidade e como ele prejudica a forma com os homens se comportam.

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  4. Estou até escrevendo com os pés, pq minhas mãos estão ocupadas batendo palmas pra vc.
    Eu sempre gostei muito de animes, mas de uns tempos pra cá, tenho me afastado dos animes, pq me incomodo muito com isso, e é triste ver ninguém fazendo nada, e ainda tentando minimizar esses tipos de acontecimentos

    Essas (e outras) problematização são muito necessárias

    Parabéns e muito obrigado por se posicionar sobre isso ❤

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  5. Achei incrível seu texto. Esses dias estava pensando a mesma coisa quando estava pesquisando animes novos para assistir e na sinopse sempre deixava claro de que o protagonista “arriscava sua vida” para salvar a garota.
    Isso começou a me incomodar, então procurei matérias na internet que falavam sobre isso, então achei seu texto.
    Recentemente existe animes que gosto muito devido ao fato de não ter esse “fanservice” e das personagens femininas serem muito fortes, que é o caso de Shingeki no Kyojin (Attack on Titan) e Jujutsu Kaisen, por isso considero esses animes os meus preferidos.
    Sinceramente, espero que hajam mais animes como esses!

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  6. Tá difícil achar um anime que não encontre harem, ecchi, donzelas em perigo… CHEGA! JÁ DEU! Eu já vi muitos shoujos e não me incomodavam o fato do protagonista proteger a guria… Mas agora que amadureci um pouco eu penso: PÔ, CARA, ELA PODE SE VIRAR SOZINHA, MEU!
    Enfim, adorei os textos! Muito reflexivos!!!

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