Impressões finais: Temporada de Inverno (2017)

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Esse texto foi originalmente postado em 31 de março de 2017
winter season de 2017 finalmente chegou ao seu fim e, verdade seja dita, a temporada foi fraquíssima. Com exceção de um ou dois títulos que tiveram um certo destaque, o resto foi de mediano pra baixo. As continuações realmente foram a única coisa que nos salvaram ao longo dessas semanas.
Seguindo os títulos que escolhemos inicialmente, falaremos nossas impressões finais sobre 3-gatsu no Lion (que começou a ser lançado na temporada passada e terminou nessa), ACCA: 13-ku Kansatsu-kaAo no Exorcist: Kyoto Fujouou-henFuukaKuzu no Honkai e Shouwa Genroku Rakugo Shinjuu: Sukeroku Futatabi-hen. Optamos por assistir aos filmes de Chain Chronicle: Haecceitas no Hikari, por isso não consta mais aqui; Schoolgirl Strikers: Animation Channel foi droppado; e Yowamushi Pedal: New Generation terá dois cours, por isso será comentado ao final da próxima temporada.
Esperamos que gostem!

3-gatsu no Lion [Gab]

O segundo cour de 3-gatsu no Lion foi bastante decepcionante. A decisão de adaptar capítulo por capítulo, algo que a Shaft faz  muito bem na série Monogatari, não funcionou aqui. Muitos episódios ficaram fragmentados, sem uma temática central e sem fechamento, deixando a progressão da história e a efetividade dos acontecimentos comprometidas. Isso aconteceu principalmente nos capítulos que servem como alívio cômico, que muitas vezes intermediavam acontecimentos importantes e quebraram a narrativa.

Os capítulos de alívio cômico no mangá funcionam de forma diferente – a leitura tende a ser mais rápida e eles funcionam como transição. No anime, às vezes os capítulos cômicos apareciam no meio de algum conflito, tirando a discussão central, mas não funcionavam como alivio, ainda mais com a direção da Shaft que tende a alongar os movimentos e usar muitas tomadas para cada cena, perdendo o timing da piada, que em geral, para funcionar, precisa ser rápida. A sensação é que essas cenas precisaram ser alongadas porque eles não queriam avançar muito a história por conta de uma segunda temporada (e é normal séries que passam na NHK terem muitas temporadas). Infelizmente, isso comprometeu o segundo cour,  que dependeu bastante do carisma dos personagens que já estavam estabelecidos, mas isso não significa que essa segunda metade não teve bons momentos.

O conflito e desenvolvimento da relação entre a Kyoko e o Rei funcionaram muito bem, já que é um relacionamento bastante complexo e, se o espectador for maduro, observará as nuances da Kyoko e não irá enxergá-la de forma maniqueísta. O outro ponto forte da temporada foi o arco do Shimada, que, de forma sutil, provocou um crescimento e uma sensação de pertencimento no Rei. Inclusive, se fosse para fazer um final original, seria muito melhor ter focado na relação Rei e Shimada do que ter feito uma cópia dos primeiros capítulos da segunda temporada, o que vai gerar uma sensação de repetição.

Ainda assim, eu acredito muito que a segunda temporada será excelente, não pela direção e o roteiro da Shaft, mas porque é a melhor parte da obra original, inclusive, foi a parte que o mangá foi premiado.

7.5/10

ACCA: 13-ku Kansatsu-ka [Mari]

Durante essas semanas em que ACCA: 13-ku Kansatsu-ka esteve no ar, dois tipos de reações foram bastante comuns: a) pessoas falando que o anime é chato porque não acontece nada e b) pessoas elogiando o visual e o desenrolar da obra. Particularmente, acredito que essa nítida diferença entre aqueles que não gostaram e aqueles que amaram a mais nova adaptação da Madhouse se deve ao fato do ritmo lento de ACCA.

Qualquer um que tenha assistido aos trabalhos anteriores da Ono Natsume, criadora da obra original, já deve saber que esse tipo de desenvolvimento é uma característica dela. Nota-se isso em Ristorante Paradiso e Saraiya Goyou, por exemplo. É realmente questão de gosto nesse caso, por isso não vou tentar convencer alguém que não curte esse estilo de escrita a assistir ACCA. Tendo dito isso, no entanto, eu gostei bastante da obra.

Inicialmente ACCA teve problemas de roteiro, com uma carga excessiva de diálogos e cenas expositivas demais. Felizmente, entretanto, essas questões foram resolvidas no decorrer dos episódios. Enquanto acompanhávamos o dia a dia de Otus e suas inspeções nos diversos distritos do reino, pouco a pouco fomos descobrindo mais sobre o que estava acontecendo naquele universo ao mesmo tempo em que aprendíamos mais sobre o nosso protagonista. Na altura do episódio 8, por exemplo, já tínhamos praticamente todas as conexões entre o enredo estabelecidas, provando que todo aquele (lento) desenvolvimento ao qual assistimos teve de fato um propósito. Além disso, os fãs da obra têm razão quando dizem que o visual é muito bonito, já que esse é provavelmente o maior destaque da adaptação.

Tecnicamente falando, ACCA possui a competência que você esperaria de uma equipe da Madhouse. Deram umas escorregadas no começo, mas logo conseguiram se encontrar e nos entregaram uma adaptação que foi, no mínimo, interessante de acompanhar.

8.0/10

Ao no Exosrcist: Kyoto Fujouou-hen [Ana]

Quando essa temporada ainda estava no início, várias pessoas criticaram  o fato de que “nada acontecia”. Depois, vi pessoas falando que o desenvolvimento foi clichê. No caso, eu não tive essas impressões e por isso estou aqui para defender essa temporada de Ao no Exorcist. Sendo convencida a assistir a primeira logo que essa lançou, eu não assisti os últimos episódios fillers, assim, eu não tive uma quebra grande de continuidade que imagino que normalmente teria.

Assim, pudemos ver os amigos de Rin, aos poucos, perceber que o fato de ele ser um demônio não interfere na pessoa que ele é – que ele pretende ser um exorcista e que eles precisam trabalhar em conjunto contra os demônios mais fortes e que realmente desejam o mal. Ao mesmo tempo, o Rin percebe que ele pode sim controlar os seus poderes e utilizá-los para o propósito desejado – tudo isso em meio às cenas de ação que foram incríveis, inclusive.

De maneira geral pudemos ver um desenvolvimento da maioria dos personagens. Achei bastante interessante focar em outros, podendo nos dar a chance de conhecer um pouco sobre os familiares do Shima e do Suguro, e o que levou à ressurreição do Rei Impuro, envolvendo também a Mamushi. Pudemos ver conflitos internos explorados, como o de Yukio e o fato de desde criança ter se dedicado a melhorar suas habilidades para proteger seu irmão, e como ele lida com o fato dessa relação sanguínea existente. Além do fortalecimento das relações de amizade, tivemos ainda um alívio cômico relacionado à Shiemi considerar o Rin um grande amigo (apenas isso, enquanto ele espera mais) e a relação entre o Juuzou e a Mamushi.

Da parte técnica não tenho nada a reclamar, inclusive já foi dito nas impressões iniciais, mas a abertura do anime foi realmente muito bem feita, e vamos sentir saudades dessa coisa linda (mas obviamente do anime também, será que poderemos ter outra continuação?).

9.0/10

 

Fuuka [Ana]

 
Sinceramente estou procurando os pontos positivos desse anime, mas está difícil. É claro que temos a música, pudemos ver que a intérprete da Fuuka tem uma voz muito bonita cantando e acho que da Hayamin a gente nem precisa comentar. No entanto, o aspecto musical muitas vezes foi deixado de lado por conflitos não muito interessantes.

Foi decidido seguir uma rota diferente daquela que ocorre no mangá, talvez por não quererem dar uma carga dramática muito grande, e por um lado acredito que foi até bom porque não boto fé que saberiam executar com qualidade. Felizmente também, as cenas com fanservice desnecessário diminuíram ao logo do anime.

O problema, entretanto, foi que a rota escolhida se tornou totalmente previsível. É absolutamente normal termos dúvidas sobre qual caminho seguir ou escolher fazer algo e depois perceber que não é aquilo que realmente desejamos, mas a Fuuka sempre quis estar na banda e resolveu sair por motivos egoístas sem se importar com as outras pessoas. Essas, em apenas um episódio já estavam seguindo suas vidas, fazendo outras atividades, imediatamente resolveram abandonar suas atividades e voltar à banda assim que Haruna propôs a todos que eles deveriam continuar.

Além disso, há todo o desenrolar entre a Koyuki e o Haruna – depois de ela ter demonstrado que seu amor por ele sempre foi a inspiração para as músicas dela, é normal que ficasse meio triste ao ser rejeitada, mas sabemos que o Haruna não é obrigado a corresponder seus sentimentos. Entretanto, na maior parte do tempo ele parece uma pessoa confusa que não sabe exatamente o que quer, até que ele finalmente se declara para a Fuuka e ela o corresponde. Mas também, se não ele não tivesse percebido depois de todas as demonstrações de ciúmes…

O Haruna não é exatamente um personagem odiável apesar de não ter lá uma grande personalidade, mas a maioria dos personagens também não é exatamente carismática. Na verdade, não há nem muito o que falar sobre o anime. De forma resumida, foi uma obra que resolvemos dar uma chance e que não foi exatamente um lixo, mas também não foi boa. Podemos dizer que a animação em si foi bonita e se manteve constante, as músicas foram legais, mas a história… acabou sendo bastante genérica.

6.0/10

 

Kuzu no Honkai [Mari]

 
Eu vim aqui pra descer o cacete nesse anime sim – bem, na verdade, nos personagens dele. O próprio título da obra já nos dá uma ideia sobre a natureza de cada um, portanto não fiquei surpresa, mas passei raiva do mesmo jeito. Com isso não quero dizer que Kuzu no Honkai é ruim – pelo contrário, a animação é muito bonita, o diretor apresenta um estilo diferenciado e a obra em si é polêmica, abrindo espaço para debates, o que sempre acaba sendo algo interessante. Entretanto, duas coisas me incomodaram:

1) A visão heteronormativa do conceito virgindade. Mesmo depois de ter transado com a Ecchan, a protagonista Hanabi continua sendo considerada como “virgem”. Por quê?

Quando questionei pessoas sobre isso, me responderam que o motivo era “porque não foi com um cara”, argumentando que a Ecchan provavelmente não conseguiu romper o hímen da Hanabi já que ela não tem um pênis. Muitas coisas estão erradas aqui: a) sexo não se resume a penetração; b) o rompimento do hímen como “prova” da perda de virgindade é uma falácia, pois ele pode ser rompido durante outras atividades (andando de bicicleta, por exemplo), além de haver casos de garotas que nascem sem o hímen ou até mesmo possuem um com um tecido que simplesmente não se rompe; c) essa visão heteronormativa do sexo perpetua a ideia de que “sexo entre mulheres não é de verdade”, gerando apagamento da sexualidade lésbica.

Ainda que o conceito de virgindade seja algo bastante pessoal (a própria Hanabi responde que é virgem quando o Mugi pergunta depois de ela ter transado com a Ecchan), fica muito nítido através da narrativa da obra como a autora encara o sexo entre mulheres e perpetua a ideia de que “sexo lésbico não é de verdade”.

2) O assédio não sendo repreendido e o fato de não terem mostrado as consequências dele. Até uma certa altura do anime, a Ecchan (além do Kanai-sensei) era a única personagem que eu conseguia defender, pois tinha pena dela (claramente é uma menina que não sabe o que é amor próprio). No entanto, essa tarefa se tornou impossível depois que ela abusou sexualmente da Hanabi na biblioteca. Embora a Ecchan tivesse apresentado um comportamento insistente antes, ela ainda tinha se certificado de ter o consentimento da Hanabi antes de continuar a fazer qualquer coisa com ela, por isso não a julguei. Nesse episódio específico, entretanto, ela simplesmente ignorou qualquer objeção da Hanabi (muito clara em seus gestos e expressões) e a tocou como se não houvesse problema nenhum, e essa ação dela não gerou absolutamente nenhuma consequência. Fiquei decepcionada com a personagem, mas acima de tudo, fiquei ainda mais decepcionada com as pessoas que acharam que esse tipo de abuso não teve valor porque aconteceu entre duas garotas.

Entendo que o objetivo da obra é gerar polêmica e no fundo não tem uma alma que se salve ali, mas independentemente de qualquer coisa, acredito que a questão do consentimento precisa ser reforçada. Mesmo que você seja uma Akane da vida e queira transar com todo mundo, você precisa se certificar de que esses atos sexuais serão consentidos.

Agora, sobre os personagens: mais do que “lixo”, eu acho que a maioria é trouxa mesmo. O Kanai-sensei e o Mugi são definitivamente os piores nesse sentido, já que estão tentando mudar uma pessoa que simplesmente não vai mudar – a Akane é uma narcisista que não ama ninguém a não ser ela mesma. Ela é falsa, realmente faz parte da escória da sociedade, mas ela sabe disso e é justamente esse fator que faz dela uma boa personagem (ainda que detestável).

A pré-Ecchan obcecada pela Hanabi e abusadora sexual também é trouxa. Mas esse é o tipo de papel de trouxa que todas as meninas que gostam de meninas correm o risco de fazer: se apaixonar por uma menina que na verdade só gosta de rapazes (ou esteja apaixonada por um). É mais comum do que você imagina, Ecchan, e teria ficado tudo bem se você não tivesse se transformado numa espécie de psicopata e aprendido a se amar primeiro. É muito irônico, inclusive, que ela não goste das investidas constantes que o primo dá nela quando a própria fez (e continua fazendo) exatamente o mesmo com a Hanabi, só que de uma forma ainda mais agressiva. Além de tudo você é hipócrita, Ecchan!

Aliás, sobre esse primo da Ecchan: me cheirou muito a macho que acredita ter um pinto de ouro que pode “converter” uma lésbica em hétero. Sim, bissexualidade existe, não estou tentando apagá-la – digo isso apenas com base no diálogo que os dois tiveram. Ecchan não tem certeza que odeia homens, mas ela sabe que gosta de meninas. Mesmo tendo conhecimento disso, havendo a possibilidade de ela realmente gostar só de meninas, o primo dela força a barra querendo dizer que ela ainda poderia se apaixonar por ele de qualquer forma. Parece familiar? Então, é aquela mesma ladainha: “você só é lésbica porque não encontrou o homem certo ainda”.

Devo admitir, entretanto, que o episódio 9 de Kuzu no Honkai articulou algo que eu não estava esperando que acontecesse: uma redenção da Ecchan. Embora nada justifique a manipulação emocional e os abusos que ela cometeu, pelo menos a obra fez questão de mostrar que a Ecchan estava arrependida do que fez e ela pediu desculpas à Hanabi. Conforme mencionei anteriormente, a Ecchan é uma menina que não possui um pingo de amor próprio e por isso estava satisfeita com quaisquer migalhas que a Hanabi oferecesse a ela (nesse caso, os encontros carnais). No entanto, a partir do momento em que a Hanabi decidisse namorar seriamente com o Mugi, a Ecchan perderia até mesmo essas migalhas que recebia – motivo pelo qual ela surtou, desencadeando todos aqueles atos obsessivos e abusivos. Agora, pensando friamente, a Ecchan percebeu que tudo aquilo não valia a pena, afinal, a Hanabi nunca se apaixonaria por ela. Ecchan não quer mais viver de migalhas, não quer estender aquela relação péssima para as duas e por isso tomou a decisão certa ao abrir mão da Hanabi (pelo menos em termos românticos). Preciso, inclusive, destacar a cena da chuva – que coisa mais bem feita! A atuação das dubladoras trouxe lágrimas aos meus olhos. Ainda que eu concorde com a Ecchan que pedir para que elas continuassem sendo amigas àquela altura do campeonato é de uma crueldade sem tamanho, eu fico feliz que ambas finalmente tenham sido honestas uma com a outra e tenham decidido fazer as coisas do jeito certo dessa vez.

Por outro lado, continuo não gostando do primo da Ecchan – o Atsuya. A única contribuição dele nesse episódio foi a cena do “se decide, colega” pra Hanabi, que ele só o fez porque aquilo atende aos próprios interesses dele também. Vi muita gente tratá-lo como um bom samaritano, mas ele não é. Ecchan já o rejeitou inúmeras vezes e ele continua insistindo, até mesmo beijando à força (na bochecha, no caso) quando ela claramente expressou que não queria. Ecchan está provando do próprio veneno, é verdade, mas ela reconheceu que aquilo não era legal – coisa que o Atsuya não parece que vá fazer.

Depois disso, tivemos o desenrolar do Mugi, da Akane e do Kanai. O Mugi não passa de um adolescente apaixonado querendo bancar o herói, por isso não tenho muito a discorrer sobre ele – estava sendo feito de trouxa porque ele queria ser feito de trouxa. Já a Akane e o Kanai, acredito que no fundo se merecem, afinal… só um sociopata pra conseguir se casar com outro sociopata.

Pra deixar claro, eu não gostei da transformação da Akane – não tem como você mudar uma pessoa do dia pra noite, muito menos uma narcisista feito ela. Em momento algum a história apontou pra esse desenvolvimento ou construiu uma narrativa que nos levasse a enxergar um pingo de possibilidade de mudança por parte dela, portanto, pra mim isso não passou de algo mal escrito. Inclusive, o Kanai é mais um adepto da ladainha do “o importante é você ser feliz” em detrimento de qualquer coisa que ele sinta e isso definitivamente não é saudável. Por esses motivos, não gosto dos dois juntos, mas… bem, só um sociopata pra conseguir se casar com outro sociopata, como disse anteriormente.

Enfim, Kuzu no Honkai é uma obra extremamente problemática, mas – pasmem! – nem é porque os personagens são uma escória que só faz uma burrada atrás da outra. Eles podem ser vazios e inconsequentes se quiserem, podem tomar decisões com base nesses sentimentos, têm permissão para cometer burradas (afinal, quem nunca?). No entanto, deveria ficar claro para as pessoas que estão acompanhando o anime como esses relacionamentos não são saudáveis.

Já discutimos aqui outras vezes como a mídia exerce influência sobre nós e é justamente por isso que o maior problema de Kuzu no Honkai se encontra em sua narrativa, nas ideias em que a autora passa e as visões que ela perpetua, nocivas principalmente quando se diz respeito à sexualidade da mulher (sobretudo lésbica). Como alguém que tem voz e está passando uma mensagem com sua obra (independentemente de qual ela seja), a autora deveria ter a responsabilidade de pelo menos procurar não contribuir com o reforço dessas ideias e visões nocivas. Pode escrever sobre coisas problemáticas? Pode. Pode distorcer tais coisas e deixar subentendido que elas não são de fato problemáticas? Não.

7.5/10

 

Shouwa Genroku Rakugo Shinjuu 2nd Season [Gab]

 
“Como uma coisa tão boa poderia acabar?” é a frase que Yotaro fala no final de Shouwa Genroku Rakugo Shinjuu. A frase traduz muito bem o sentimento que deixa esse último episódio: chegamos ao final de uma obra prima. Rakugo é um anime ambicioso, simbólico, ambíguo e escrito de forma magnifica. A primeira temporada foi um dos melhores animes que eu vi nos últimos anos e, agora, com o final da segunda temporada, posso dizer que é um dos melhores animes que eu já vi na minha vida (e olha que já são 20 anos  vendo animes).

A trajetória simbólica (e sobrenatural) da morte do Yakumo em contraste com o crescimento solar de Yotaro produziu  uma grande história sobre o amor à arte, o amor entre as pessoas e o amor pela tradição e a sua renovação.  Além disso, acompanhamos discussões de gênero bastante interessantes, como a conquista da Konatsu, ao se tornar a primeira mulher a fazer Rakugo, e a conversa entre a Miyokichi e o Yakumo no episódio 11, quando ela lhe confessa que morrer foi algo que lhe deu paz de espírito, pois ela estava cansada do seu papel como mulher.  Essa fala, em especial, foi muito significativa, pois diferente da Konatsu, Miyokichi não abraçou e nem queria a maternidade, ainda que amasse sua filha, e viveu uma vida muito sofrida por estar à mercê do amor.

As partes simbólicas ou metafísicas de Rakugo funcionam muito bem por conta da estrutura narrativa. Assim, como na primeira temporada, a história se configura como um grande Rakugo sobre aqueles personagens, cheio de reviravoltas sobre o passado e com representações simbólicas sobre os sentimentos e os acontecimentos. Dessa forma, o roteiro nos despista, ao mesmo tempo, na sua própria estrutura, nos alerta a prestar atenção nos detalhes, duvidando das histórias contadas pelos personagens, especialmente o grande artista de Rakugo, o Yakumo, e observando a relação entre os personagens. E dessa relação, chegamos ao último episódio, que como um bom Rakugo, deixa a grande revelação para o final – fechando perfeitamente a história.

A nova promessa do mundo do Rakugo carrega o sangue de Yakumo e Sukeroko, já que o pai do filho da Konatsu é o próprio Yakumo. Muitas pessoas ficaram desconfortáveis com esse final e eu entendo. Afinal, pela ambiguidade do roteiro (que reproduz a estrutura de um Rakugo), a revelação ficou para o último segundo, o que acabou parecendo mais um choque sem sentido, principalmente para aqueles que não estavam atentos ao subtexto da trama, até porque o texto principal queria nos fazer acreditar que, no final, Shinosuke, Yakumo, Konatsu e Yotaro viraram uma família (e viraram, mas não uma tradicional). Ainda que eu ache que essa ambiguidade não funcione, sinto que condiz com a construção narrativa e, acima de tudo, preveniu qualquer tipo de romantização. Konatsu e Yakumo nunca tiveram uma relação de pai e filha. O tempo todo Konatsu marcava o seu distanciamento e só após consolidar a sua relação com Yotaro, ela permitiu ter uma relação mais familiar com Yakumo. No segundo episódio, por exemplo, a linguagem corporal entre o Yakumo e Konatsu não é paternal, ele deita próximo dela de forma até sexual e ela também se aproxima, dividindo o mesmo futon.  No décimo episódio, a proximidade entre os dois já é diferente, misturando o passado, a mágoa, o agradecimento e, finalmente, uma sensação de família.

O que me entristece, e isso é provocado pelo próprio roteiro, é ver a discussão do anime ser pautada apenas nessa revelação final, esquecendo toda a grandiosidade sutil da própria construção narrativa. Eu mesma poderia ficar infinitamente falando de cada episódio, cada personagem e cada simbologia da história. Mas é isso que um bom Rakugo faz: ele mexe com os nossos sentimentos e faz com que a sensação final nos marque. E, com certeza, Shouwa Genroku Rakugo Shinjuu me marcou para o resto da vida.

10/10

2 comentários em “Impressões finais: Temporada de Inverno (2017)

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